Pronaf 30 anos: trajetória, impactos e perspectivas
- alexandrequeiroz41
- há 5 dias
- 4 min de leitura
Programa é celebrado como marco na valorização da agricultura familiar e segue desafiado a se adaptar às novas agendas de sustentabilidade e inclusão

No último dia 25 de agosto, uma live comemorou os 30 anos do Programa Nacional de Fortalecimento da Agricultura Familiar (PRONAF), instituído em 1995 e hoje consolidado como uma das políticas públicas mais importantes para o campo brasileiro. O encontro marcou também o lançamento do e-book gratuito “Pronaf 30 anos: Uma revolução silenciosa que transforma o campo brasileiro”, reunindo especialistas, pesquisadores e protagonistas da história do programa.
Contexto histórico e criação
O PRONAF nasceu em um período de crise do crédito rural e abertura econômica, nos anos 1980 e 1990, quando pequenos produtores enfrentaram dificuldades diante da competição ampliada. A mobilização de movimentos sociais como a Confederação Nacional dos Trabalhadores na Agricultura (CONTAG) e a Central Única dos Trabalhadores (CUT), por meio de ações como o Grito da Terra Brasil, pressionou por políticas diferenciadas.
A categoria “agricultura familiar” ganhou visibilidade graças ao apoio da academia e de documentos como as Diretrizes de Política Agrária de Desenvolvimento Sustentável (1995). Dessa articulação emergiu o PRONAF, inicialmente como uma linha de crédito, mas que logo se consolidaria como uma política abrangente e estruturante.
Expansão e impactos
De política de crédito, o PRONAF se transformou em uma plataforma de políticas integradas. Entre as iniciativas derivadas destacam-se:
Programa de Aquisição de Alimentos (PAA) e Programa Nacional de Alimentação Escolar (PNAE), que abriram mercados institucionais para a produção familiar;
Seguro Garantia-Safra, oferecendo proteção contra perdas;
Programa Mais Alimentos, que modernizou e mecanizou a agricultura familiar;
Agroamigo, maior programa de microcrédito rural da América Latina, com metodologia de agentes locais e alta taxa de adimplência.
Estudos do Instituto de Pesquisa Econômica Aplicada (IPEA) e da FAO destacam o PRONAF como elemento-chave na redução da pobreza rural, na diversificação da produção agrícola e na segurança alimentar nacional.
Identidade e inclusão

O sociólogo Sérgio Schneider avalia que o PRONAF “construiu a agricultura familiar no Brasil”. O programa deu nome, legitimidade e reconhecimento a um grupo social antes invisível. Outro marco é a participação feminina, impulsionada por linhas de crédito específicas. Hoje, as mulheres representam 75% do público do PRONAF B (microcrédito), fortalecendo a renda e os sistemas de produção em quintais voltados à segurança alimentar.
Desafios para o futuro
Apesar dos avanços, especialistas apontam desafios:
Alinhamento com a agenda climática e ambiental, estimulando agroecologia e bioeconomia;
Expansão regional para Norte e Centro-Oeste, com foco em povos indígenas, quilombolas e comunidades tradicionais;
Ampliação da Assistência Técnica e Extensão Rural (ATER) para adoção de novas práticas;
Simplificação do crédito e adaptação do sistema bancário às especificidades da agricultura familiar.
📊 PRONAF: de 1995 a 2025
Aspectos | PRONAF em 1995 (criação) | PRONAF em 2025 (30 anos depois) |
Natureza | Linha de crédito específica para pequenos produtores. | Programa estruturante com diversas linhas de crédito e políticas complementares. |
Público-alvo | Pequenos agricultores, ainda pouco reconhecidos como categoria. | Agricultura familiar consolidada, com identidade e legitimidade social. |
Volume de recursos | Recursos limitados, restritos ao crédito de custeio. | Mais de R$ 70 bilhões/ano em linhas de crédito (dados MDA, 2023). |
Políticas derivadas | Não havia complementação além do crédito. | PAA, PNAE, Garantia-Safra, Mais Alimentos, Agroamigo, ATER. |
Reconhecimento da agricultura familiar | Categoria invisível ou diluída no conceito de trabalhador rural. | Reconhecida como pilar da segurança alimentar do país. |
Impacto produtivo | Baixa escala, dependência de insumos externos e limitada inserção em mercados. | Contribui com 70% dos alimentos consumidos no Brasil (FAO/IBGE). |
Inclusão social | Mulheres e jovens praticamente ausentes do crédito. | 75% do PRONAF B destinado a mulheres; jovens têm linhas próprias. |
Segurança alimentar | Não havia políticas integradas ao crédito. | Programas de compras institucionais garantem mercado e renda. |
Abrangência geográfica | Concentração no Sul e Sudeste. | Forte no Nordeste; desafios de expansão para Norte e Centro-Oeste. |
Desafios | Reconhecimento e acesso inicial ao crédito. | Sustentabilidade, clima, inovação tecnológica, diversificação e ampliação territorial. |
📌 Esse quadro deixa evidente que o PRONAF passou de uma resposta emergencial a um sistema de políticas públicas complexas, com grande peso na economia rural e na segurança alimentar.
GPP e STAC
O debate sobre políticas públicas no campo encontra ressonância direta na Universidade de São Paulo, especialmente no trabalho do Grupo de Políticas Públicas (GPP/ESALQ/USP), um dos núcleos de extensão vinculados ao Centro de Agricultura Tropical Sustentável (STAC/USP).
O GPP se dedica a estudos aplicados de políticas de desenvolvimento rural, com foco em agricultura familiar, segurança alimentar e sustentabilidade. Projetos conduzidos pelo grupo analisam, por exemplo, o impacto do crédito rural, a evolução dos programas de compras públicas de alimentos e as estratégias de combate à fome em diálogo com o Estado e a sociedade civil.

No âmbito do STAC, esses estudos integram um esforço maior de articulação acadêmica e internacional, que busca soluções tropicais sustentáveis para os grandes desafios globais da agricultura, incluindo a redução de desigualdades sociais, a transição energética e a adaptação às mudanças climáticas.
Assim como o PRONAF estruturou uma nova visão para a agricultura familiar no Brasil, o STAC e o GPP atuam hoje como centros de referência na formulação, avaliação e difusão de políticas públicas que garantam a prosperidade do setor em bases sustentáveis.
Celebrado como uma “revolução silenciosa”, o PRONAF completa três décadas reconhecido como a política que mais impactou a agricultura familiar no país. Sua permanência e reinvenção são cruciais para os próximos 30 anos, diante dos desafios climáticos, tecnológicos e sociais que se colocam.
Fonte: FEALQ